MUSEUS DE CIÊNCIA - UM BREVE HISTÓRICO

A essência de um museu é seu acervo. É ele que define sua classe ou área de atuação (Arte, Ciência, Técnica, entre outras). O hábito de colecionar objetos remonta às mais antigas raízes da civilização humana. Diversos registros pictóricos e achados arqueológicos sustentam o o fato de que o ser humano primitivo guardava coisas pelos motivos mais diversos e, principalmente, atribuía-lhes certa escala de valor.

ORIGEM DA PALAVRA MUSEU


Segundo a mitologia grega, Zeus teve 9 filhas com a titânide Mnemósine, às quais eram atribuídas a inspiração nos ramos da Arte e da Ciência. O "Mouseion" era o Templo das Musas, espaço que congregava ambientes para estudo e aperfeiçoamento do saber, além de uma biblioteca com textos e alguns aparatos e instrumentos dedicados ao ensino - algo que tem certas semelhanças com uma universidade, visto que suas funções eram o ensino e a pesquisa. Fora criado na cidade de Alexandria pelo governador Ptolomeu I, designado para reinar no Egito pelo conquistador Alexandre, o Grande.

Após a destruição do Museu e da Biblioteca de Alexandria, estas instituições entraram nas sombras do domínio da Igreja Católica na Idade Média, tendo suas coleções consideradas pagãs e, portanto, dizimadas ou incorporadas a instituições vinculadas ao clero, ao estado ou à aristocracia. A necessidade de conservá-las, estudá-las e, posteriormente expô-las, é que vai reacender a chama dos museus.

AS COLEÇÕES E OS MUSEUS DE CIÊNCIA


Os museus de ciência modernos têm sua origem em salas chamadas de "gabinetes de descoberta" ou "gabinetes de curiosidade" (figura 1) do período renascentista (séculos XIV a XVII), que por sua vez, estão ligados às expedições para desbravamento e extração de riquezas das novas terras ou ao material conservado pelos nobres e pelo clero. Estes espaços abrigavam coleções de objetos variados - desde exemplares de rochas, da flora e da fauna das terras conquistadas, até fósseis, armas, jóias e outros bens colecionáveis, que constituíam a riqueza e o status dos nobres em um período de turbulência monetária.

Figura 1: ilustração de um gabinete de descoberta. 
Inicialmente, as coleções não tinham critérios de classificação e o acesso era permitido somente a outros nobres para contemplação ou para poucos pesquisadores que desenvolviam estudos - especialmente para avaliar o "valor" do acervo. Algumas exceções ocorriam nas coleções mantidas pela Igreja, as quais eram expostas ao público com o intuito de propagar mensagens de fé.

Com o crescimento das exposições e da abrangência dos ideais renascentistas, surgem as "galerias", salas compridas, estreitas e bem iluminadas que serviam de laboratório para artistas e pesquisadores e espaços de contemplação das riquezas, incrementando a parcela da população com acesso à estes objetos.

O interesse pela cultura e pelas ciências tem um novo impulso a partir do século XVII, dado pelos enciclopedistas franceses. A população começa a reivindicar e vários filósofos da época endossavam a proposta de expor os "produtos" da ciência, como cita Francis Bacon: “...estabelecimento de um museu de invenções e de uma galeria com retratos dos inventores do século XVII, para destacar a importância prática das emergentes artes e ciências mecânicas”.

Neste cenário um ávido colecionador chamado Elias Ashmole doa sua coleção à Universidade de Oxford, a qual cria, em 1693, o primeiro museu público de ciências do mundo: o Ashmolean Museum (figura 2).

Figura 2: Ashmolean Museum - Inglaterra.
Em 1793 é criado o primeiro museu de arte do mundo, o Museu do Louvre, cujo acervo originou-se da nacionalização dos bens e joias da coroa durante a Revolução Francesa. O Conservatoire de Arts et Metiers em Paris é fundado um ano depois, tendo como premissas o ensino de ciências e artes aplicadas, a aprendizagem de técnicas industriais e o desenvolvimento industrial.

Os novos métodos de manufatura fulcrados no uso de máquinas em substituição ao processo artesanal ocasiona a chamada Revolução Industrial, que impacta diretamente na proposta e na missão dos museus. Tais instituições são vistas como vitrines do desenvolvimento industrial, expondo princípios científicos e de funcionamento das máquinas, ou seja, um espaço para o ensino das técnicas e para aproximar o público do progresso industrial.

Em 1908 é criado o Museu de Ciências e das Técnicas de Munique em 1908, considerado um marco para os museus e ciência modernos, haja vista que seu fundador, o engenheiro Oskar Von Miller, procurava tornar acessível as descobertas e inovações tecnológicas e ilustrava máquinas e princípios físicos através de modelos manipuláveis (experimentos). A preocupação com a educação nos museus de ciência crescia à medida que as exposições eram, cada vez mais, projetadas com o intuito de promover a participação do público: a interatividade através do modelo push-boton (aperte o botão).

A partir deste ponto, diversas instituições surgem com os propósitos de Oskar em outras partes da Europa e dos EUA, tais como Museu da Ciência e da Indústria de Chicago (1933) e  Palácio das Descobertas em Paris (1937). Após a 2ª Guerra Mundial, Frank Oppenheimer (físico americano e pesquisador do projeto Manhattan que culminou com as bombas atômicas) perde seu cargo na universidade por ligações com o Partido Comunista no período pré-guerra e torna-se professor. Diante dos desafios de ensinar conceitos físicos básicos (pressão e temperatura, por exemplo) às crianças, desenvolveu demonstrações em classe que considerou bastante profícuas. Em 1959 ele retorna à Universidade e continua interessado em tais atividades. Suas pesquisas culminam com a fundação do Exploratorium (figura 3) em 1969, na cidade de São Francisco. Oppenheimer era um crítico ao modelo "aperte o botão", o qual julgava ser insuficiente para promover a interação intelectual com o público. Defendia a manipulação física dos objetos através da percepção visando criar vínculos entre o processo de manipulação e reflexão, chamado de hands-on.

Figura 3: Exploratorium, São Francisco, EUA.
Tal qual o  Museu de Ciências e das Técnicas de Munique, o Exploratorium também consiste em um marcos para os museus de ciência atuais, tendo suas ideias orientado a construção de novos espaços pela América e pela Europa.

Em terras tupiniquins, o marco zero dos museus é o Museu Nacional (figura 4), criado em 6 de junho de 1818 por D. João, cujo objetivo era catalogar e estudar as riquezas brasileiras. Em 1821 ele abre ao público, às quintas-feiras, em um horário específico.

Figura 4: Museu Nacional do rio de Janeiro.

Após o Museu Nacional, surgem as seguintes instituições:
  • Em 1866 é fundado o Museu Paraense, com o objetivo de estudar a Amazônia;
  • O terceiro museu do país é criado no Paraná em 1876, o Museu Paranaense;
  • Em 1957 cria-se o Instituto Butantã.

A partir daí, temos a proliferação destas instituições em várias especialidades:
  • Embrião do Museu de Ciência e Tecnologia da PUC/RS – 1967 (Museu  de História Natural da PUC/RS);
  • Estação Ciência (1987);
  • Espaço Ciência (1994);
  • Parque da Ciência Newton Freire Maia (2002).

O desenvolvimento histórico apresentado pode ser encarado sob o prisma de outras visões e formas de classificação. Uma das possibilidades baseia-se  na visão presente nos trabalhos de MCNANUS (1990), a qual classifica os museus de ciência em 4 conforme o grau de interatividade e como esta é entendida:
  • 1ª Geração: Santuários de objetos - apenas a contemplação e preservação;
  • 2ª Geração: Mostrar os produtos da ciência e do avanço tecnológico, através do “aperte  o botão e veja o que acontece” – demonstrativo;
  • 3ª Geração: União das "qualidades" da 1ª e 2ª gerações levando à uma experiência diferenciada através da manipulação e reflexão sobre os temas presentes no acervo;
  • 4ª Geração: Caracterizam-se pela tecnologia de ponta e diferem dos de 3ª por despertarem a criatividade do visitante e por apresentarem experimentação com final aberto sobre temas de seu cotidiano.
Ressalta-se que o recorte apresentado nesse texto está longe de ser encarado como um tratado acerca do surgimento e evolução dos museus, sobretudo, os de ciência, diante da complexidade e das múltiplas categorias de análise que envolvem tais processos. O texto objetiva, em linhas gerais, estabelecer alguns pontos de apoio para os leitores interessados e tornar público, principalmente aos educadores e estudantes que frequentam o Parque da Ciência, que o mesmo integra um universo vasto de instituições espalhadas pelo mundo, sendo que algumas apresentam centenas de anos de existência!

Por Anisio Lasievicz


REFERÊNCIAS

COSTANTIN, A. C. C. – Museus de Ciência e Tecnologia: Espaços Complementares de Educação? - Disponível em http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=33905604. Acesso em 28/07/2013.

DIB, C. Z. - Formal, Non-formal and Informal Education: Concepts/Applicability – In "Cooperative Networks in Physics Education: Conference Proceedings 173" - American Institute of Physics - New York, 1988, pg. 300 a 315.

GASPAR, A. Museus e Centros de Ciências – Conceituação e Proposta de um Referencial Teórico. USP – Banco de Teses e dissertações.

MCNAMUS, P. M. - Watch Your Language! People Do Read Labels - In: What Research Says about Learning in Science Museuns - ASTC, 1990, pg. 4-6.

PADILLA, J. - Desarrollo de los Museos y Centros de Ciencia en México. Conferência em Curso para Treinamento em Centros e Museos de Ciência. Estação Ciência – USP. São Paulo – 2000.

RIBEIRO, M. E. C. – Os Museus e centros de ciência como ambientes de aprendizagem – Dissertação de Mestrado - Universidade do Minho, Portugal, 2005.

Postar um comentário

0 Comentários